quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

"...estive preso e foste me visitar..." Eric Jóia

"...estive preso e foste me visitar..."



Por Eric Jóia




Essa fala não é minha, é do Cristo. Registrada por seus  biógrafos e está me fazendo pensar faz mais de um ano.

Ele explica que ao visitar o encarcerado, os discípulos  estariam visitando ao próprio Cristo.
Pois bem. Penso que, salvo injustiças e canalhices, ninguém  é preso por fazer o bem. Consegue imaginar um adolescente  sendo preso porque ganhou uma olimpíada de matemática, ou um  empresário porque fez uma doação para um asilo? Via de  regra, presos são os que praticaram alguma conduta que é tão  inaceitável pela sociedade que a mesma diz: essa pessoa não  pode mais conviver com a coletividade.

O Cristo disse que seria reconhecido por seus discípulos no  rosto de um criminoso, não dos benfeitores.

Olhando o raso discurso dos cristãos modernos que fazem coro  com a lei do abate livre fico a pensar o que diriam esses  "pequenos cristos" se Jesus nascesse em nossa época e  pregasse a mesma mensagem.

Na minha leitura, a mensagem de Jesus foi: Vocês me  reconhecerão quando conseguirem mover o coração na direção  de quem não merece pois é essa a essência da graça de Deus.  A graça é justamente pra quem não merece, do contrário,  seria apenas a mais óbvia justiça.


A revelação do Cristo é, sobretudo, relacional. Quando o  movimento do coração se direciona para o caminho,  sofrimento, angústia do outro... ali está o Cristo. No  toque, no contato, na empatia, na capacidade de se doar, se  envolver, se condoer... Eis o Cristo. No descolamento do  mórbido egoísmo, na capacidade de se indignar com a  injustiça... eis o Cristo. No impulso da partilha, na  consciência de que abundância não é ter demais mas que  ninguém tenha de menos... eis o Cristo. Na compreensão das  diferenças, no acolhimento dos desiguais, no respeito às  individualidades... eis o Cristo.

Pelo menos o meu Cristo se encontra dessa forma, não na  vacuidade do discurso puritano e moralista que quer regrar  comportamentos sem mudar a natureza como se dormir dentro de  uma garagem transformasse alguém em carro.

Assim como Jesus não "desencarcerou" o bandido, nem tampouco  tirou da cruz o outro condenado, não há qualquer apologia a  que o indivíduo não tenha que pagar pelos seus crimes  perante a sociedade. Minha questão é: como "matar" é tão  simples para os cristãos de hoje.




A descartabilidade do ser humano anexada nessa cartilha dos  cristãos de hoje me deixa mesmo perplexo e no Rio de Janeiro  a coisa anda a passos largos para mortes cada vez mais  numerosas. Vai faltar fuzil pra ser "encontrado" nas mãos de  gente morta (a maioria esmagadora negra) nas favelas do RJ.

Sou capaz de admitir que numa situação em que um policial  esteja num confronto com um bandido armado que ele tenha que  atirar e que não haja, na maioria esmagadora dos casos,  tempo hábil para se atirar no pé, por exemplo. E que para se  defender ou para defender outros inocentes ele tenha que  atirar pra matar maaaaasssss o que me assusta é ver como  isso é banal, nem dói. Desconfio até que muitos nutram até  certa alegria.

Ainda acredito que bandido bom é bandido preso, classificado  de acordo com o tipo de crime que cometeu, pagando de forma  justa e proporcional por seus erros,numa cela que respeite  as condições mínimas de dignidade humana, ensinado sobre a  possibilidade de mudar de vida, com acesso a estudo e  profissionalizado para ser devolvido ao convívio social  quando pronto. Dará certo com todos? óbvio que não mas que a  gente salvaria uma fila de gente... aahhhhh salvaria.

Eu sei que muitos não concordam mas isso dura apenas até que  um filho ou parente, por deslize, se envolva com o lado  errado da vida e seja preso. Aí qualquer bandido vira "só um  garoto que cometeu um deslize mas ele não é disso".


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