A fome como desafio ético e espiritual da humanidade.
Leonardo Boff
Publicado em 19/05/2017 ACESSE:
Os níveis de pobreza mundial são estarrecedores. Segundo a Oxfam, que anualmente mede os níveis de desigualdade no mundo, somente oito pessoas possuem renda igual à que têm 3,6 bilhões de seres humanos, ou cerca da metade da humanidade. Tal fato é mais que a palavra fria “desigualdade”.
Leonardo Boff
Publicado em 19/05/2017 ACESSE:
Os níveis de pobreza mundial são estarrecedores. Segundo a Oxfam, que anualmente mede os níveis de desigualdade no mundo, somente oito pessoas possuem renda igual à que têm 3,6 bilhões de seres humanos, ou cerca da metade da humanidade. Tal fato é mais que a palavra fria “desigualdade”.
A pobreza é sistêmica, pois é fruto de uma sociedade que tem por objetivo acumular bens materiais sem qualquer consideração humanitária (justiça social) e ambiental (justiça ecológica). Ela pressupõe pessoas sem solidariedade, num contexto de alta desumanização e até de barbárie.
No Brasil, por mais que o país tenha saído do mapa da fome, existem ainda 20 milhões vivendo em extrema pobreza. Com seu programa Brasil Carinhoso, a ex-presidente Dilma Rousseff propunha-se a tirar essa multidão dessa situação desumana.
São múltiplas as interpretações que se dão à pobreza. A mim é esclarecedora a posição do Prêmio Nobel de Economia, o indiano Amartya Sen, que criou a economia solidária. Para ele, a pobreza não se mede pelo nível de ingressos nem pela participação dos bens e serviços naturais. Ser pobre é ver-se privado da capacidade de produzir a cesta básica ou de acessar a ela.
A Teologia da Libertação e a Igreja que lhe subjaz nasceram a partir de um acurado estudo da pobreza, que é lida como opressão. Seu oposto não é a riqueza, mas a justiça social e a libertação. A opção dos pobres contra a pobreza é a marca registrada dessa teologia.
Distinguíamos três tipos de pobreza. A primeira é aquela dos que não têm acesso à cesta básica e aos serviços sanitários mínimos. A estratégia tradicional era fazer com que os que têm ajudem aqueles que não têm. Daí nasceu uma vasta rede de assistencialismo e paternalismo. Ajuda pontualmente os pobres, mas os mantém na dependência dos outros.
A segunda afirmava que o pobre possui inteligência e capacidade de profissionalizar-se. Com isso é inserido no mercado de trabalho e arranja sua vida. Essa estratégia é correta, mas politicamente não se dá conta do caráter conflitivo da relação social.
A terceira interpretação parte de que o pobre, quando conscientizado dos mecanismos que o fazem pobre, organiza-se e projeta um sonho novo de sociedade mais justa e igualitária; transforma-se numa força histórica, capaz de, junto com outros, dar um novo rumo à sociedade. Dessa perspectiva nasceram os principais movimentos sociais, sindicais e outros grupos conscientizados da sociedade e das igrejas. Desses, podem-se esperar transformações sociais.
Por fim, para uma percepção da fé bíblica, o pobre sempre será a imagem desfigurada de Deus, a presença do pobre de Nazaré, crucificado que deve ser baixado da cruz. E por fim, no entardecer da história universal, os pobres serão os juízes de todos porque, famintos, nus e aprisionados, não foram reconhecidos como a presença anônima do próprio Juiz Supremo, face ao qual, um dia, todos comparecerão.
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